28 de novembro de 2011

Casal Geek Entrevista: Fábio Moon e Gabriel Bá


Qual foi o dia mais importante da sua vida? Quem está acostumado a pensar que histórias em quadrinhos se fazem apenas de seres superpoderosos ou patos falantes pode até estranhar, mas esse é um tipo de pergunta que marca o trabalho dos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá.

Detentores de vários prêmios, como um Jabuti pela adaptação de O Alienista e alguns Eisner, os irmãos começaram a publicar suas histórias no fanzine 10 Pãezinhos, que criaram em 1997 e teve 40 edições lançadas de forma independente, e atualmente produzem quadrinhos tanto para o mercado americano quanto para o nacional.

Seus trabalhos autorais já foram publicados também na França, Espanha e Itália, e o mais recente - Daytripper - foi lançado pelo selo Vertigo nos EUA e figurou na lista dos quadrinhos mais vendidos do The New York Times.

Não é exagero dizer que os gêmeos sejam, talvez, os quadrinistas brasileiros mais importantes da atualidade, por todas as conquistas e pela boa recepção que a dupla tem tanto por parte do público quanto por parte da crítica, e foi sobre seu trabalho que conversamos um pouco nessa entrevista que eles nos concederam:

Arte de Fábio Moon para a capa de Dark Horse Presents #2

Com as suas histórias sendo publicadas por grandes editoras tanto aqui quanto fora do país, chegou o momento em que vocês podem viver exclusivamente dos Quadrinhos?

Fábio: Temos vivido só de Quadrinhos desde 2008.

Gabriel: Mas isso se deve ao nosso trabalho publicado por editoras nos EUA. O dinheiro que ganhamos no Brasil com Quadrinhos ainda não sustentaria nossa vida. Quem sabe um dia.

Vocês nasceram juntos, cresceram juntos, trabalham juntos desde o início... Como foi quando começaram a trabalhar separadamente, com outros autores?

Fábio: Trabalhar com outros autores foi um aprendizado, pois eles tem referências diferentes das suas, então imaginam situações, cenários e personagens que você precisa melhorar como artista para trabalhar com a mesma desenvoltura com que cria suas próprias histórias. Nos tornamos melhores artistas nesse processo. Além disso, ler o roteiro de outra pessoa é como entrar na cabeça dela um pouco, ver como ela pensa os Quadrinhos, então pudemos estudar um pouco outros modos de pensar uma história em Quadrinhos.

Vocês têm alguns títulos que remetem a música, como "Rock’n’Roll", "Meu coração, não sei por que" e "Daytripper". Como é a relação da música com o trabalho de vocês?

Gabriel: Música inspira muito, mexe com as sensações, sentidos, sentimentos, tanto a harmonia, melodia, quanto as letras, que são como a poesia. Nós somos muito influenciados por esse poder da música de agarrar as pessoas, dialogar com quem está escutando, pois acreditamos que os Quadrinhos podem criar a mesma conexão. Adoro ir em shows, ver bandas ao vivo, fazer parte da platéia e compartilhar aquele momento. É a sua vida acontecendo, fazendo parte da história. A arte é assim.

O 10 Pãezinhos surgiu em 1997. De lá pra cá, como vocês acham que o seu trabalho evoluiu? Tem alguma coisa do início que vocês olham, hoje em dia, e pensam "eu faria diferente" ou "eu não faria isso"?

Gabriel: Tudo foi acontecendo na hora certa e reflete o momento que aconteceu. Hoje somos mais completos, mas não estaríamos aqui se não tivéssemos passado pelo que passamos, feito o que fizemos. Cada passo tem o seu papel na jornada.

Daytripper foi publicada primeiro lá fora, para depois chegar ao mercado brasileiro. Isso foi uma escolha de vocês?

Fábio: Daytripper foi um projeto que surgiu de um convite da Vertigo, depois de anos de trabalhos aqui no Brasil ou em outras editoras lá nos Estados Unidos. Nossa escolha foi tentar encontrar maneiras de contar nossas histórias da melhor maneira possível, e encontramos no mercado americano uma maneira de ganhar o sustento com as nossas histórias. Não me incomoda que uma história seja publicada primeiro lá fora, mas me incomodaria se ela não tivesse sido publicada aqui.

Gabriel: Queremos que as pessoas leiam nossas histórias. Publicar no mercado americano nos proporciona isso, tem um alcance muito maior e leva nosso trabalho pro mundo inteiro. Mas fazemos o esforço de que todos nossos trabalhos sejam publicados aqui no Brasil também, mais cedo ou mais tarde.

Arte de Gabriel Bá para a capa de Daytripper #10

Os quadrinhos são a mídia em que vocês se consagraram como contadores de histórias. Vocês gostariam de ver as suas histórias adaptadas para o cinema, por exemplo?

Fábio: Eu gostaria que alguém me deixasse com vontade de ver alguma história minha adaptada para o cinema, mas por enquanto isso não aconteceu.

Gabriel: eu não acho que o cinema é melhor que os Quadrinhos, e prefiro me concentrar em contar histórias da maneira que eu acho mais legal, que é em Quadrinhos.

Alguns trabalhos que vocês fizeram para a Dark Horse já estão sendo vendidos de forma digital. Vocês pensam em distribuir seus quadrinhos autorais nesse formato também?

Fábio: acho que ainda é cedo para pular no bonde da distribuição digital. Não tenho pressa, prefiro pensar numa maneira de fazer isso bem-feito.

Há pouco tempo vocês estiveram em Belo Horizonte, participando do FIQ. O que vocês acharam do evento?

Gabriel: Foi o maior evento de HQ que fomos aqui no Brasil e acho que reflete o ótimo momento que o Quadrinho nacional está vivendo. Foi incrível.

Nessas viagens que vocês fazem para participar de convenções, dá para curtir as cidades que visitam? Dá para levar algo delas para suas histórias?

Gabriel: Tentamos conversar com as pessoas, ouvir histórias, ficamos muito atentos ao mundo à nossa volta, mas é tão rápido que sempre teremos uma visão de estrangeiro, de alguém que está de passagem. Pra se aprofundar mais, seria preciso ficar mais tempo e pesquisar mais a fundo a cidade e as pessoas, como fizemos em Manaus pra adaptação do "Dois Irmãos" e como fizemos em São Luís do Maranhão também.

Existe algo que vocês nunca teriam feito, se não estivessem trabalhando com quadrinhos?

Fábio: Acho que a gente nunca teria ido para Angola. Com certeza, não teria conhecido nenhuma das pessoas incríveis que conheci por causa dos Quadrinhos.