Harold Smith está morto. Sentindo-se impuro por conta da traição da qual foi vítima, o recluso botânico tirou a própria vida. Antes do seu ato final de desespero, Harold destruiu sua casa, suas orquídeas e os diários que guardava, entre eles o de Laura Palmer.
No pouco que se salvou do diário, Cooper encontrou várias referências a BOB, um possível amigo de Leland que, desde o início da adolescência de Laura, a molestou de forma regular. Em uma passagem datada de poucas semanas antes da sua morte, a jovem escreveu: “Eu tenho que contar ao mundo sobre Benjamin.”
Benjamin Horne, uma figura importante e poderosa em Twin Peaks, foi amante de Laura Palmer durante o curto período em que a garota trabalhou no cassino/bordel One-Eyed Jack's, do qual ele é dono. Além disso, ele vive, como predito por MIKE, em uma “grande casa de madeira, rodeada de árvores, com muitos cômodos idênticos que são ocupados por almas diferentes, noite após noite”, o hotel Great Northern.
Junte essas informações ao fato de que Philip Gerard/MIKE, o ex-parceiro do assassino BOB, entra em convulsão no exato momento que Benjamin Horne aproxima-se dele, e temos agora o maior (e mais novo) suspeito do assassinato de Laura Palmer.
O excelente episódio anterior contou com um time de primeira, mas este sétimo episódio da segunda temporada traz no comando o dream team de Twin Peaks, a dupla David Lynch e Mark Frost, os criadores da série.
O primeiro projeto da dupla Lynch e Frost foi um filme baseado no livro Goddess - The Secret Lives of Marilyn Monroe, e mostraria os últimos meses de vida da atriz, cujo assassinato, na história, seria ordenado por um homem poderoso, ninguém menos que Bobby Kennedy. O filme não saiu do papel, mas não é difícil encontrar ecos de sua trama na história de Laura Palmer, ainda mais neste momento em que um figurão torna-se o principal suspeito de seu assassinato.
Twin Peaks estreou na TV americana com um público estimado em cerca de 34 milhões de espectadores, mantendo uma média de pouco mais de 18 milhões de espectadores durante a primeira temporada. Por motivos diversos, entre eles a mudança no horário de exibição, a série sofreu com frequentes quedas na audiência, chegando ao ponto dos seus criadores sucumbirem à pressão da emissora para fazer o que não desejavam: revelar o assassino de Laura Palmer.
Muitos são os suspeitos de matar Laura Palmer: Bobby Briggs, seu namorado cheio de atitude; James Hurley, seu namoradinho secreto; Dr. Jacoby, seu excêntrico psiquiatra; Leo Johnson e Jacques Renault, dois traficantes com os quais a garota participava de orgias; Harold Smith, o recluso portador do diário secreto mantido por Laura; Benjamin Horne, um dos homens mais poderosos da cidade, dono do cassino/bordel One-Eyed Jack's e ex-amante da jovem.
Independente de quem seja o assassino, ele está sob influência de BOB, uma entidade que alimenta-se do medo, dor e prazeres do seu hospedeiro. Em uma cidade de 51.201 habitantes, qualquer um pode estar possuído por BOB, até mesmo a instável Nadine ou o pacato Pete Martell. E o assassino de Laura Palmer é... Patience you must have, my young padawan.
Como que em resposta ao assédio da emissora, o episódio começa com os homens da lei tomando um café sossegadamente. Philip Gerard/MIKE tem que ser levado ao Great Northern para tentar identificar o hospedeiro de BOB e a casa de Harold Smith precisa ser revistada, mas ninguém está com pressa. Tudo se resolverá no seu devido tempo.
A manhã também é preguiçosa na casa dos Palmers, onde Leland, Sarah e Maddy curtem o aconchego do sofá ao som de What a Wonderful World. A jovem, entretanto, precisa retomar sua própria vida em Missoula. Seus tios, obviamente, ficam tristes com a notícia, mas entendem que ela precisa partir.
Outras garotas, entretanto, têm assuntos mais controversos a tratar. A primeira é Shelly Johnson, obrigada a largar o emprego para cuidar do marido, o bandido Leo Johnson. Como resultado de uma ideia
A segunda é a bela Audrey Horne, agora recuperada da overdose à qual foi submetida e de posse de informações relativas às atividades ilícitas do pai no lado canadense da fronteira. Em uma série acostumada a mostrar homens em uma posição de poder em relação às mulheres, é interessante como uma Audrey mais madura por tudo que passou inverte esse jogo, ao interrogar o pai, o arrogante Benjamin Horne, agora diminuído pela vergonha que até então não o vimos sentir.
Ben Horne, como aconteceu com outros suspeitos do assassinato de Laura Palmer, acaba preso, mas Cooper não parece tão seguro de que tenha capturado o homem certo, pois ele parte para o pub Roadhouse imediatamente após uma dica da Mulher do Tronco: “Nós não sabemos o que vai acontecer ou quando, mas as corujas estão no Roadhouse.”
A voz etérea de Julee Cruise ecoa pelo salão do pub enquanto Cooper, mais soturno do que nunca, acompanha o show e observa os demais presentes. De repente, a banda dá lugar a uma visão do Gigante, que alerta melancólico do palco de cortinas vermelhas: “Está acontecendo novamente.”
De volta à casa dos Palmers, um vinil gira indefinidamente após alcançar o final da sua última faixa. O ventilador de teto também dá voltas intermináveis, um mau presságio se faz sentir: algo ruim voltará a acontecer.
Sarah Palmer arrasta-se escada abaixo e tem a visão de um cavalo branco em sua sala de estar; Maddy sente um cheiro forte de óleo queimado e desce até a sala, onde encontra a tia desacordada; pouco antes de encontrar a sobrinha, Leland arruma-se em frente ao espelho no qual vê refletido um sorriso macabro, o sorriso de BOB, pronto para matar novamente.
Twin Peaks gira em torno de um mistério, o assassinato de Laura Palmer, mas sempre que David Lynch toma as rédeas, a série vira uma história de terror. Foi assim quando o local do crime apareceu em cena, foi assim quando Maddy encontrou seu destino final nas mãos de Leland/BOB.
Diferente da da primeira cena, cuja calma parecia feita para confrontar o estúdio e a pressa da audiência, ao entregar o assassino no final do episódio, David Lynch não é econômico. É como se o diretor quisesse dizer: “Vocês querem o assassino? Aqui está ele em toda a sua glória; aqui está toda a sua crueldade, toda a sua violência.”
Diz a lenda que o ataque a Maddy foi filmado com três atores diferentes para que o assassino não fosse descoberto antes da hora: Frank Silva (BOB), mais assustador do que nunca; Ray Wise (Leland Palmer), também assustador, mas igualmente atormentado; Richard Beymer (Benjamin Horne), que tudo indicava ser o verdadeiro culpado, mas que não passou de um engodo.
Infelizmente, a gravação de Beymer não pode ser encontrada nos materiais extras lançados em DVD ou, posteriormente, no bacanudo box Twin Peaks - The Entire Mystery, mas nada é capaz de superar um pai como a origem de todo o terror vivido por uma filha, terror esse que a levou a uma vida de vícios, que culminou com a sua morte.
Se em algum momento David Lynch e Mark Frost chegaram a cogitar Benjamin Horne como o assassino de Laura Palmer, e tudo indica que sim, felizmente a dupla fez a escolha certa ao optar pelo inesperado. Não é à toa que até hoje, assistindo à série pela terceira vez, a revelação da identidade de BOB ainda cause arrepios.
- Ouvindo: Nine Inch Nails - The Perfect Drug
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