Japão, 1666. Decidido a vencer uma guerra antes mesmo dela começar, o daimiō Hideki Tachikawa faz um pacto com a deusa caída Izanami. O shōgun busca um exército invencível, mas a entidade das sombras acaba por transformar em imortais todos os soldados e membros do seu clã.
Shima Kuretake é um desses soldados, o primeiro a voltar da morte. Participante de uma guerra na qual se envolveu apenas por pedido do pai, o jovem samurai foge do campo de batalha para tentar voltar à vida normal ao lado da família e dea sua amada Tomoko.
Entre os outros mortos revividos, um grupo de soldados - os Sete Condenados - liderados pelo nobre Capitão Takahata recebe a tarefa de executar Daisuke Yatsutomo, o filho do shōgun rival, enquanto são caçados pela mortal monja Lua da Primavra.
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Em um universo pop dominado por hordas de mortos-vivos, soa desnecessária outra obra envolvendo desmortos. Só que, diferente do que o título levar a entender, Shogun dos Mortos não é uma história sobre samurais em meio a um apocalipse zumbi. O foco da obra criada por Daniel Werneck é a guerra e a forma como ela afeta a todos envolvidos de forma direta ou indireta no conflito; o fato dos valorosos guerreiros japoneses voltarem da morte é apenas um detalhe.
Ao contrário dos zumbis do vodu e dos mortos-vivos de George Romero, os guerreiros desmortos de Daniel Werneck têm total consciência de sua situação. Eles exalam o odor fétido da morte e alimentam-se apenas de cérebros, mas suas mentes continuam intactas nos corpos em lento estado de putrefação. Vítimas de um pacto do qual não participaram, são figuras trágicas como o monstro de Frankenstein, trazido à vida em um mundo que não o aceita.
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Lançado no FIQ de 2013, Shogun dos Mortos é fruto de um financiamento coletivo bem sucedido através do Catarse. A obra tem, obviamente, forte influência dos jidaigeki, os filmes de época japoneses dos quais se destacam os épicos obrigatórios de Akira Kurosawa, e também bebe na fonte do cinema de zumbis formatado por George Romero, principalmente o toscão A Volta dos Mortos-Vivos. Entretanto, não podem ser esquecidos os filmes de guerra como Os Doze Condenados e MASH,esses a maior influência na dinâmica dos personagens em meio ao conflito.
Como já é de se esperar, a arte de Daniel Werneck segue o padrão pouco convencional dos quadrinhos independentes, com um traço bastante rudimentar em alguns momentos. A princípio há um certo incômodo e a sensação de que um ilustrador experiente fez falta, mas o background do autor em Cinema de Animação compensa sua deficiência com uma narrativa e enquadramentos cinematográficos que casam bem com a estrutura não linear da história.
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Shogun dos Mortos parece uma história escrita por Mike Mignola e dirigida por Quentin Tarantino. O resultado, como é de se imaginar, daria um filme bizarro e bem divertido de assistir. O projeto deu origem à Cripta do Shogun, uma publicação paralela com histórias escritas e desenhadas por outros artistas, mas um segundo volume com a continuação da saga principal não tem previsão de ser lançado tão cedo. Uma pena, pois eu compraria sem pensar duas vezes.
- Ouvindo: Jaill - Getaway